quinta-feira, 17 de setembro de 2009

As duas visões para Portugal




Pelos vistos o tema veio para ficar. Porque, no fundo o TGV se tornou no grande símbolo das diferenças que dividem as duas grandes linhas que estão em jogo para Portugal a partir de 27 de Setembro de 2009, e das quais Portugal seguirá apenas uma.

Por um lado, aquilo a que vou chamar de visão "Socrática", que visa combater o subdesenvolvimento e o atraso do nosso país com grandes políticas de investimento público que incluem entre outras e não só - o TGV, a terceira ponte sobre o Tejo, o novo aeroporto de Lisboa ... esta política encontra-se em linha com a conjuntura política internacional - é certo e sabido que à esquerda e à direita, tem sido este o rumo defendido pelos executivos por esse mundo fora, desde a América de Obama (que pretende até criar um Serviço Nacional de Saúde, pasme-se! Algo que se nos dissessem há 5 anos certamente não acreditaríamos), à Alemanha de Merkl, passando pelas políticas defendidas pelo executivo japonês, entre outras que não interessa para aqui agora, porque compreendem aonde quero chegar.

Por trás desta política encontra-se o descontentamento geral que as chamadas políticas neo-liberais têm levantado(políticas que preconizavam o fim da interferência dos governos em assuntos "privados": tanto a nível social como a nível económico) . Esta crítica a estas políticas surge como fruto da grande crise mundial a que assistimos. Todos são unânimes em compreender que estas políticas estão em grande parte na base da péssima conjuntura económica em que vivemos. Num artigo recente do "The Economist" assistimos mesmo a um facto histórico e provavelmente único da história deste semanário, em que no Editorial se defendia o chamado "modelo francês", um modelo a que o "The Economist" nunca poupou críticas (porque a França sempre teve uma política de regulamentação do Estado sobre a economia desalinhada com o chamado modelo "anglo-saxão"). Os próprios admitiam nesse editorial, com um certo humor, que era a primeira vez que o faziam.

E de facto, a verdade é, que quando a crise financeira rebentou, a quem recorreram as grandes corporações se não aos respectivos governos? Desde os anos 70 que não havia tantas nacionalizações como agora, por exemplo.

Podemos então concluir, e voltando agora ao caso português, que esta visão "Socrática" tem inúmeras vantagens. Não só está em alinhamento com as políticas seguidas pelos principais países industrializados (e isto é importante, quer se queira, quer não), como, no caso português, se reveste de uma urgência ainda maior do que a que tem porventura noutros países. Num tecido empresarial entorpecido e tradicionalista, as grandes políticas públicas permitirão também uma mudança radical de mentalidades, capazes de dar o exemplo em matérias desta importância, demonstrando que o investimento em novas tecnologias ou em áreas desconhecidas até agora pelo tecido empresarial português trazem benefícios e sustentabilidade. Conjuguemos isto com uma política de incentivo às energias renováveis, uma política de ensino regrada e eficaz, e uma política a que chamarei de "abertura social", e combateremos também três das grandes enfermidades portuguesas da modernidade:

- a eterna dependência do petróleo, que corresponde a mais de 50% da nossa dívida externa;
- as parcas qualificações dos nossos cidadãos;
- a repressão e negação de liberdades da nossa sociedade, que advém do nosso passado tradicionalista .

Isto permitirá quebrar o ciclo económico português em que vivemos desde os anos 50, como já referi anteriormente. De uma forma muito resumida, Portugal precisa de retirar de si a etiqueta de país de mão-de-obra barata e de baixas qualificações, e recolocar-se uma etiqueta de país investidor em áreas de ponta e em novas tecnologias. Penso que é claro que esta política terá vantagens decisivas para o futuro do nosso país.

Por outro lado, vejamos o que está na outra grande linha "ideológica" das duas que referi no início do texto. Para evitar ser chamado de sectarista, não a vou chamar de visão "leiteira". No entanto, assumo que tenho dificuldades em dar-lhe um nome que pegue. Penso que me vou ficar por agora por "segunda visão" por falta de nome mais conveniente.

A visão defendida por muitos portugueses, e que tem neste momento como principais figuras Manuela Ferreira Leite e Paulo Portas (entre outras claro), é muito simples. A nível financeiro, os seus traços são um decalcamento exacto das políticas neo-liberais que referi anteriormente - diminuição drástica do Estado Social, da influência do Estado nas decisões empresariais e corporativas, diminuição da carga fiscal ao mínimo, e benesses para grandes fortunas. Parece-me ser uma política que vem com cinco anos de atraso em primeiro lugar. Em segundo lugar, estes cinco anos de atraso ( talvez dez!) demonstraram a sua ineficácia : então não foi graças a esta política que a crise financeira rebentou? Nunca percebi a insistência dos partidos populistas portugueses nestas matérias. Apesar de ser certo e sabido que a nossa direita sempre admirou e procurou à sua medida imitar as políticas estado-unidenses, especialmente as do partido Republicano, já desde a altura do Estado Novo de Salazar, custa a perceber porque insistem numa política que está a viver um dos períodos mais negros de sempre na sua história. Não vejo grandes vantagens em "bater no ceguinho" como se diria popularmente, pois esta política neste momento, apesar de ter talvez algumas benesses, serviria apenas para perpetuar o tradicionalismo do tecido empresarial português e dar-nos-ia um pouco "mais do mesmo" do modelo que já vimos que deixou de funcionar para Portugal. Do que Portugal precisa é de uma mudança drástica de mentalidades e de atitudes, coisa que estas políticas pecam em não conseguir fazer.

A nível social e político as coisas são mais negras. Os partidos da direita portuguesa parecem ter enveredado por uma política de populismo exacerbado sem precedentes em Portugal desde o 25 de Abril. Os partidos da direita, como já referi em artigos anteriores, habituaram-nos ao discurso alarmista, ao discurso de "boatos" na comunicação social, ao discurso demagógico de caça de votos pueril, em que se procura ganhar vantagem aproveitando um clima de "pânico" e desconfiança que se vive na sociedade portuguesa, e que, a meu ver, é exagerado. Portanto não são erradas as críticas que se lhes fazem - de um certo vazio ideológico, porque na verdade é isso que o discurso populista é, que visa apenas apelar aos instintos mais básicos do nosso povo e evitar a todo o custo a discussão racional das coisas. Portugal precisa de sair do marasmo social que vive desde o início de século. Já há muito que sabemos que o nosso modelo falhou. Durante décadas vivemos sob os auspícios de um Estado autoritarista com fortes influências ideológicas das alas mais conservadoras da Igreja, e todos sabemos também que este modelo apenas nos trouxe dormência social e perpetuou o nosso provincianismo, deixando-nos num "Orgulhosamente sós" perpétuo sem vistas de uma saída ou de uma luz ao fundo do túnel. Pois neste momento Portugal corre o risto de ficar "Humilhantemente só" nas suas políticas. Portugal precisa de sair deste marasmo saloio e aceitar as influências positivas da globalização. Precisamos de uma sociedade mais moderna, mais dinâmica e mais aberta. Precisamos de garantir uma sociedade diversificada, cosmopolita, informada e crítica. Tenho sérias dúvidas que conseguíssemos fazer isso se seguíssemos as políticas que nos oferece a direita em Portugal.

Assim fica claro quem deve ganhar estas legislativas. O povo português deverá compreender o que está em jogo, e que ficou mais ou menos definido aqui, um pouco à minha maneira, mas que penso, consegui descrever bastante detalhadamente.

Avança Portugal!

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